Esta síntese veio de algumas leituras na área de historia e de bioética. Para quem quiser aprofundar no tema, indico o artigo de Mattew Lu, "Embryology: Medieval and Modern.", "Abortion and Contraception: Corruption of Medicine" (do mesmo Mattew Lu), "Abortion and Catholic Church: a Summary History" do John T. Noonan e o primeiro capitulo do livro "Estatuto do Embrião Humano", que trata do desenvolvimento da embriologia até nossos tempos. Espero que possa ser útil e proveitoso aos estudiosos do tema.
1. Grécia Clássica.
1.1. Hipócrates e seu juramento (V a.C) admitem implicitamente a humanidade do embrião em todas as etapas do desenvolvimento. Distinguia, segundo seus discipulos, entre ekbolia (aborto em até 7 dias) e phtoria (após 7 dias), sendo o primeiro menos grave que o segundo. Escribonio Largo, discipulo, dizia sobre o Juramento: " não é permitido comprometer o futuro incerto de um homem."
1.2. Aristóteles e a doutrina dos 3 tipos de almas: há potencialmente 3 almas no corpo humano que se manifestam tão logo o substrato material esteja pronto para permiti-lhes a ação. As 3 almas são: (i) nutriz ou vegetativa, (ii) sensivel e (iii) intelectiva. Lançou as premissas para a teoria da animação tardia.
1.3. Estóicos: negavam toda autonomia do feto antes do nascimento (secs. III e II a.C). Submissão do embrião à corporeidade materna - portio matris uteri vel viscerum.
2. Cristianismo: Patristica e Escolástica
2.1. Tertuliano: "Não há diferença entre tirar uma vida ja nascida e destrui-la antes de nascer. Ela é um homem que quer tornar-se um homem - homo quia est futurus." (Apologeticum)
2.2. São Basilio: "Aquela que mata deliberadamente o feto é culpada de assassinato. Entre nós, com efeito, a distinção sutil entre um ser formado e não formado não é feita. (...) A destruição do feto é [...] criminosa, conforme a intenção, seja qual for, daqueles que tenham tamanha audácia." (Epistola)
2.3. Gregório de Nissa: "Dado que o homem, composto de corpo e alma, é um único ser, sustentamos que a ele deva atribuir-se um único principio comum de existência, para que não seja ao mesmo tempo antecedente e anterior a si mesmo." (De hominibus officio) -> Princípio da Unidade.
2.4. A reflexão medieval: a influencia das noções de "feto formado" e "não formado". A animação adiada prevaleceu no medievo escolastico, por causa da influencia de Aristóteles.
2.4.1 Os livros Penitenciais de Teodoro (séc. VII a VIII): penalidades para o crime de aborto variavam com base no periodo de gestação. Até 40 dias era considerado inanimado, e após esse periodo, animado.
2.4.2. Santo Anselmo de Aosta sustentava a animação adiada, pois para ele parecia absurdo que tantos embriões concebidos possam morrer com o pecado original e ser assim privados da graça de Cristo, Assim, admitia que a infusão da alma ocorre somente depois de o corpo ter adquirido figura humana.
2.4.3. Santo Alberto Magno, filósofo, biólogo, cientista: O embrião, sob impulso de uma única virtus formativa, passa sucessivamente por várias formas: é, vive, sente, compreende. Cada forma está contida na anterior, como ato de uma potencia anterior. Enfatiza a natureza que distingue o homem do animal. O homem não pode ter princípio analogo ao do animal, pois é humano desde o princípio, Intuição da " originalidade genética".
2.4.4. Santo Tomás: segue a doutrina aristotélica das 3 potencias da alma. A virtus formativa esta contida na semente masculina que, juntando-se à materia feminina, torna-a propicia a receber a alma vegetativa. Depois é substituida pela alma vegetativa e sensitiva. Por fim, a virtus creativa de Deus infunde uma alma ao mesmo tempo com potencias vegetativas, sensitivas e racionais. Tirar a vida em qualquer desses momentos é pecado grave, mas só no último estágio pode ser considerado crime.
3. Revolução cientifica. Séc XVII: conduzido os debates pelas ciencias naturais. Teorias: epigênese, que viam no embrião o fruto de uma formação e desenvolvimento progressivo de suas várias estruturas; teorias pré-formacionistas, que sustentavam que o embrião ja esta contido, como que em "miniatura", no gameta feminino (versão ovista) ou masculino (versão animaculista)
3.1. Tomas Fyens (1620) declarou que a infusão da alma racional dava-se após 3 dias da concepção, pois 3 dias era o momento em que as "duas sementes" se unem e operam sua concretização.
3.2. Reinier de Graff (metade séc. XVII): o foliculo ovariano foi descrito. Considerou o ovário não só como componente muito mais ativo no processo da geração, mas também como sede da formação do ser humano (pré-formacionista).
3.3. Girolamo Fiorentini (+1678): consideração probabilística da presença da alma racional desde a concepção. Sustentou a absoluta necessidade de batizar fetos abortados.
3.4. Paulo Zacchia (1583-1658), médico pontifício: "a alma racional esta presente no embrião no primeiro instante da concepção, sendo que todas as operações vitais originam-se dela, não da alma vegetativa e sensitiva." (Quaest. medico legalis)
(Paul Zacchia)
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