Extemplo Libyae magnas it Fama per urbes, /
Fama, malum qua non aliud velocius ullum;/
mobilitate viget viresque acquirit eundo, /
parva metu primo, mox sese attollit in auras… (Eneida, IV, 173-176)
“monstrum horrendum, ingens, cui, quot sunt corpore plumae/
tot linguae, totidem ora sonant, tot subrigit aures. (Eneida, IV, 181-183)
(...)
Haec tum multiplici populos sermone replebat/
gaudens, et pariter facta atque infecta canebat (Eneida, IV, 189-190)
Quando certa vez Aristóteles afirmou que a poesia seria superior a história, uma vez que a história conta a história de particulares e a poesia é capaz de falar sobre todos os homens em todos os tempos, ele não estava enganado. De fato, na Roma do Imperador Augusto, é possível conhecer uma imagem literária dada a nós por Virgílio (70 a.C - 19 a.C) e que revela como compreender a ideia de Fama.
Logo no livro IV de sua Eneida, o poeta - contando a história do herói Enéias e da Rainha Dido - escreve que apareceu a Fama, vindo da Líbia. E a descrição que o poeta nos oferece é singular: é um monstro velocíssimo que passeia pelas cidades, horrendo e imenso, cujo corpo contém milhares de plumas, milhares de línguas, milhares de olhos - sempre vigilantes - e também milhares de ouvidos. Tal monstro não se cansa de ir aos homens na cidade para contar milhares de coisas, falsas e verdadeiras, falsas ou verdadeiras, falsas com verdadeiras e verdadeiras com falsas.
De alguma maneira, esta imagem parece ter influenciado algumas histórias populares que buscam ensinar o valor de preservar a boa fama dos outros e tomar o devido cuidado com a temeridade no juízo, para que se evite seus irreparáveis danos. É bem conhecida a história de um homem que, ao ter ouvido uma calúnia feita contra seu melhor amigo, espalhou-a por toda a cidade, até que veio um tempo que este amigo era desprezado por todos os cidadãos; posteriormente, tendo sido provada a falsidade da calúnia e a malícia do caluniador, o homem que espalhou a calúnia decidiu ir, em prantos, ao amigo implorar seu perdão.
Este bom e caluniado amigo, ofereceu o perdão, mas com uma condição: que o que pedia o perdão tomasse em mãos um enorme recipiente no qual seriam colocadas milhares de plumas, às quais deveriam ser lançadas de forma periódica de modo que se espalhassem pela cidade inteira. Tendo feito isso, voltou ao caluniado dizendo ter feito o que lhe fora solicitado, e aquele o respondeu: “Muito bem! Agora, como último passo, volte e recolha todas as plumas pelo caminho.”
A moral da história é clara: as plumas foram lançadas em locais específicos, mas o vento as espalhou de tal forma que foi impossível desfazer aquilo, e ainda que se fizesse uma busca com toda a diligência em cada mínimo detalhe da cidade à procura das plumas, certamente sobrariam algumas que nunca seriam encontradas, sendo irremediável o dano causado e inimaginável a sua repercussão.
Assim, a fama - Fama Velox - deixa suas feridas de forma rápida e irreparável na honra dos que sofrem calúnias. E a reparação sempre será insuficiente para desfazer a ferida que permanecerá para sempre.
Imaginemos todos os casos conhecidos em que uma falsa acusação - motivada muitas vezes por desentendimentos pessoais ou dinheiro - assassinou reputações que até então eram ilibadas: o caso do Cardeal Georg Pell, que foi acusado de pedofilia, e depois foi absolvido por fortes evidencias de que o crime em questão não houvesse sequer ocorrido - não sem antes ter passado tres anos preso injustamente; o caso recente de Pe. Robson, do Santuário do Divino Pai Eterno, que após graves acusações feitas em rede nacional, com reportagens extensas, foi declarado inocente, tendo-se descoberto que os acusadores tinham motivações financeiras para aquelas acusações. Nenhum destes mereceu, da parte da mídia, uma retratação condigna: por vezes, noticiou-se por um minuto acerca de sua declaração de inocência, enquanto para a acusação, horas e mais horas. É impossível restaurar essa honra que já foi tão manchada: o vento espalhou as calúnias de forma definitiva, e sempre sob estes homens permanecerá na opinião pública a dúvida - por mínima que seja - quanto a seu caráter.
A Fama, de Virgílio até nós não mudou seus procedimentos: continua a espalhar plumas, a usar seus milhares de olhos e espalhar por milhares de línguas aquilo que precisa para destruir a fama dos bons homens e desviar a atenção que seria dada os seus comparsas - como certos meios de comunicação tem feito. Desde ontem (06/12/2020) os meios de comunicação e a opinião pública tem espalhado as mais absurdas calúnias e especulações acerca da integridade moral do Arcebispo de Belém do Pará, Dom Alberto Taveira, e sem ter ouvido ambas as partes, o povo - que se pensa “voz de Deus” - já deu a sentença condenatória para o Bispo - que todos sabem ser de conduta irrepreensível - e a sentença absolutória de si mesmos.
De fato não se pode deixar de notar que muitas dessas calúnias são feitas em tom de zombaria, como se os caluniadores, ao verem as pretensas imoralidades dos homens bons, se sentissem justificados em suas próprias imoralidades. De fato, o que se vê é muitas vezes uma vontade imensa - diria que talvez seja uma “fé”- querendo acreditar que se um homem bom supostamente comete imoralidade, as suas próprias estarão automaticamente justificadas - ou no mínimo, não poderão ser julgadas.
Se nas calúnias comuns ao menos se sabe com clareza uma das versões em todos os seus detalhes, a Fama Velox, no caso em questão, não teve sequer como usar seus milhares de olhos para ver todos os detalhes do caso - que corre em segredo de justiça -, não pode usar seus ouvidos - já que não há fonte clara das denúncias, mas apenas calúnias e suposições vindas por meio de “telefone sem fio” -, e assim, a única coisa que este monstro horrendo e ingente pôde fazer foi espalhar as plumas de suas calúnias com suas milhares de línguas.
Mas como todo cristão sabe, não é essencial que se tenha mil olhos, não é algo sequer desejável, se estes são cegos ou se cegam voluntariamente. Na verdade, é de fato melhor ter apenas dois olhos, mas dois olhos capazes de enxergar, capazes de ver as coisas com profundidade e dizer “Domine, ut videam” - Senhor, que eu veja!
Nesta Fama veloz, que destrói com facilidade e agilidade, fazendo com que todas as coisas passem, que possamos nos fixar nas coisas que não passam, perceber neste tempo de Advento uma oportunidade de alegria, de escutar o “gaudete et exsultate” de Cristo, que afirma que são bem aventurados aqueles que são caluniados e perseguidos por causa de Seu Nome:
"Bem-aventurados sereis quando vos caluniarem, quando vos perseguirem e disserem falsamente todo o mal contra vós por causa de mim. 12.Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus, pois assim perseguiram os profetas que vieram antes de vós”. (Mt 5, 11-12)
As Bem-Aventuranças prometidas para estes são, de fato, pouco compreendidas no mundo secular que vivemos, mas a certeza que se tem é que Dom Alberto certamente abraça neste momento sua Bem-Aventurança e também sua Cruz - elas, desde Nosso Senhor, são inseparáveis - , mas como bom pastor que é para seu povo, sabe que é ajudado pelas orações do seu rebanho da Igreja de Belém e que a verdade - que liberta - há de prevalecer contra aqueles que levantam calúnias.
Lucas Fonseca dos Santos
06/12/2020
Deus o abençoe Prof Lucas. Grata por ler tão belo texto. Que possamos alcançar a graça desejada e que a verdade seja reestabelecida o quanto antes. Oremos. (E a reparação sempre será insuficiente para desfazer a ferida que permanecerá).
ResponderExcluirOs nossos parabens e muito OBRIGADO Prof Lucas, por essa linda carta muito bem redigida, Deus o abençoe !!!
ResponderExcluirObrigado, Lucas. Excelente.
ResponderExcluirAtte.,
Mário Ribeiro
Parabéns pelo texto Lucas. Em oração por Dom Alberto.
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